Os seres humanos estão vivendo em um mundo de plâncton. Esses organismos minúsculos estão espalhados pelos oceanos, cobrindo quase três quartos do planeta, e estão entre as formas de vida mais abundantes da Terra.
Mas o mundo em aquecimento colocam os plânctons em risco, ameaçando toda a cadeia alimentar marinha que é construída a partir deles.
Há um ano, a NASA lançou um satélite que forneceu a visão mais detalhada até agora da diversidade e distribuição do fitoplâncton. Suas percepções devem ajudar os cientistas a entender as dinâmicas em mudança da vida no oceano.
“Você gosta de respirar? Você gosta de comer? Se sua resposta para sim, então você se importa com o fitoplâncton”, disse Jeremy Werdell, cientista líder do programa de satélites, chamado PACE (Plâncton, Aerossol, Nuvem, Ecossistema Oceânico).
Historicamente, a pesquisa feita a partir de navios capturou imagens limitadas, oferecendo apenas vislumbres dos oceanos em constante mudança. O surgimento de satélites deu uma visão mais completa, mas ainda limitada, como olhar através de óculos com um filtro verde.
“Você sabe que é um jardim, você sabe que é bonito, você sabe que são plantas, mas você não sabe quais plantas”, exemplificou Ivona Cetinic, oceanógrafa da NASA. O satélite PACE remove efetivamente o filtro e finalmente revela todas as cores do jardim, disse ela. “É como ver todas as flores do oceano.”
Essas flores são o fitoplâncton, pequenas algas aquáticas e bactérias que realizam fotossíntese para viver diretamente da energia do sol. Eles são comidos pelo zooplâncton, os menores animais do oceano, que, por sua vez, alimentam peixes e criaturas maiores.
O fitoplâncton forma a base da cadeia alimentar marinha, e as mudanças climáticas estão abalando essa base.
O fitoplâncton no mar aberto parece estar diminuindo. No início dos anos 2000, os cientistas detectaram que enormes zonas oceânicas com menos nutrientes e fitoplâncton mais escasso, conhecidas como desertos oceânicos, estão se expandindo.
Algumas florações de fitoplâncton crescem tanto e tão rapidamente que, quando se decompõem, esgotam o oxigênio na água circundante, criando “zonas mortas” onde nada mais pode viver. E alguns fitoplânctons produzem toxinas que podem adoecer e matar peixes, pássaros e mamíferos, incluindo humanos.
Os pesquisadores estimam, de forma conservadora, que as florações nocivas custam à economia dos EUA cerca de US$ 50 milhões por ano, relacionados a danos a saúde pública, pesca e recreação costeira.
No inverno de 2021, milhões de ostras na costa da Paróquia de Plaquemines, na Louisiana, morreram repentinamente, causando um grande prejuízo aos pescadores locais. A investigação revelou que fitoplâncton tóxico havia florescido após uma tempestade, de acordo com Bingqing Liu, oceanógrafa e professora-assistente na Universidade da Louisiana, em Lafayette.
Aprofundamento
Enquanto os satélites ajudam alguns oceanógrafos a ampliar a visão para obter a melhor imagem possível, outros pesquisadores estão se aprofundando no tema com coletas de plâncton no oceano para estudo em microscópios.
Esses cientistas não estão apenas olhando para o jardim descrito por Cetinic, mas entrando nele, examinando tanto plantas quanto animais. E estão cavando, olhando sob a superfície onde os satélites não podem ver.
No Atlântico Norte no inverno, o jardim oceânico esconde um fenômeno curioso. Estendendo-se dos Estados Unidos e Canadá até a Europa, quadrilhões de criaturas minúsculas estão adormecidas, suspensas na zona crepuscular do oceano. Trata-se do Calanus finmarchicus, um tipo de zooplâncton que flutua nas correntes e marés do oceano.
No Atlântico Norte, o Calanus canaliza a energia do sol e do fitoplâncton para animais maiores como peixes, baleias e pássaros.
Você pode pensar no Calanus como “pequenas baterias que estão flutuando no oceano”, disse Jeffrey Runge, ecóloga especialista em zooplâncton que recentemente se aposentou como professor da Universidade do Maine.
De volta ao laboratório, após o anoitecer, ele e outros cientistas observaram os Calanus finmarchicus capturados sob um microscópio. Os espécimes tinham grandes sacos de óleo, cheios de lipídios ricos em calorias que peixes e baleias-francas procuram.
Em estudos experimentais, Fields e seus colegas descobriram que, à medida que a temperatura aumenta, os Calanus ficam menores e têm menos gordura em relação ao tamanho do corpo.
Uma imagem mais completa
Em janeiro, um grupo de pesquisadores europeus pediu apoio contínuo para programas de monitoramento de plâncton de longo prazo.
Desde a década de 1930, os cientistas têm fornecido a navios comerciais dispositivos chamados registradores contínuos de plâncton para rebocar e coletar automaticamente plâncton em redes longas que se enrolam como pergaminhos. Esses métodos e muitas rotas permaneceram consistentes por décadas, permitindo que os cientistas observem as mudanças nas populações de plâncton ao longo do tempo.
Nos Estados Unidos, a NOOA (Administração Nacional Oceânica e Atmosférica) conduz pesquisas de plâncton semelhantes às de Fields desde a década de 1960, ajudando os gerentes de pesca a rastrear a saúde dos ecossistemas de que sua indústria depende.
O último Relatório do Estado do Ecossistema para a Nova Inglaterra, produzido pelo Centro de Ciências de Pesca do Nordeste da Noaa, documentou uma floração de fitoplâncton recorde em 2023 e também descobriu que o zooplâncton em partes da plataforma continental do nordeste está se diversificando, um sinal potencial de reestruturação do ecossistema, de acordo com o relatório.
Em particular, espécies menores, mais gelatinosas e menos ricas em energia estão aumentando.
Os cientistas enfatizam a necessidade de manter os conjuntos de dados de longa duração em andamento.
“O monitoramento realmente não é uma ciência sexy”, disse Michael Parsons, oceanógrafo da Universidade da Costa do Golfo da Flórida. “É difícil manter o financiamento consistente para estar rotineiramente coletando amostras e observando o que está lá.”
Fontes: Folha SP, New York Times.
Foto: Billy Hickey/NYT.
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